A União Europeia<br>é projecto esgotado<br>com o qual urge romper

DE­CLARAÇÃO Nos 60 anos dos tra­tados que ins­ti­tuíram o pro­cesso de in­te­gração ca­pi­ta­lista eu­ro­peia, o PCP re­a­firma a ne­ces­si­dade de rup­turas pro­gres­sistas que ga­rantam a so­be­rania e o di­reito dos povos ao de­sen­vol­vi­mento.

O PCP quer romper com os me­ca­nismo de do­mínio e sub­missão da UE

A de­cla­ração do Par­tido, pro­fe­rida por Ângelo Alves, da Co­missão Po­lí­tica, acon­teceu dois dias antes do início da reu­nião, dia 25, de chefes de Es­tado e de go­verno da União Eu­ro­peia a 27, em Roma, co­me­mo­ra­tiva dos 60 anos da as­si­na­tura dos tra­tados que ins­ti­tuíram o pro­cesso da Co­mu­ni­dade Eco­nó­mica Eu­ro­peia, an­te­ces­sora da UE. O di­ri­gente co­mu­nista co­meçou por con­trapor à «onda de ce­le­bração e pro­pa­ganda» sus­ci­tada por tal ani­ver­sário a si­tu­ação real, con­creta, dos tra­ba­lha­dores e dos povos do con­ti­nente eu­ropeu e as crises com que o pró­prio pro­cesso de in­te­gração se con­fronta: uma e ou­tras, ga­rantiu, re­velam a «ver­da­deira na­tu­reza de classe da União Eu­ro­peia», o apro­fun­da­mento das suas con­tra­di­ções e a sua in­ca­pa­ci­dade em dar res­posta aos pro­blemas dos povos.

A crise em que a UE se en­contra mer­gu­lhada, re­alçou Ângelo Alves, é de tal forma pro­funda que até as suas pró­prias ins­ti­tui­ções e res­pon­sá­veis se vêem for­çados a re­co­nhecê-la, desde logo no «Livro Branco» da Co­missão Eu­ro­peia. Porém, alertou, esse re­co­nhe­ci­mento faz-se acom­pa­nhar das ten­ta­tivas de bran­que­a­mento das res­pon­sa­bi­li­dades pró­prias nesta si­tu­ação, por um lado, e de as pro­curar passar para a crise eco­nó­mica e so­cial, os re­fu­gi­ados, os na­ci­o­na­lismos ou o ter­ro­rismo, por outro. Ora, su­bli­nhou, todos estes gra­vís­simos pro­blemas de­correm da na­tu­reza, ob­jec­tivos, pi­lares, po­lí­ticas e ins­tru­mentos da União Eu­ro­peia.

Como re­alçou o di­ri­gente co­mu­nista, ao con­trário do que se pro­cura fazer crer, a União Eu­ro­peia não re­pre­senta um «pro­cesso de co­o­pe­ração» nem tem uma di­mensão «so­cial e de­mo­crá­tica», pois nunca foram os in­te­resses dos tra­ba­lha­dores e dos povos ou os va­lores da so­li­da­ri­e­dade, con­ver­gência, pro­gresso so­cial e paz a de­ter­miná-la. Pelo con­trário, trata-se de um pro­cesso de «do­mínio eco­nó­mico e po­lí­tico, de con­cen­tração de ca­pital e de poder, de­se­nhado de acordo com os in­te­resses dos mo­no­pó­lios eu­ro­peus e do di­rec­tório das prin­ci­pais po­tên­cias ca­pi­ta­listas na Eu­ropa», e em par­ti­cular da Ale­manha.

Apro­fundar só agrava

Re­a­fir­mando o que há muito o PCP vem de­fen­dendo, Ângelo Alves ga­rantiu que a UE é um pro­cesso «es­go­tado, cor­roído por in­sa­ná­veis con­tra­di­ções», que ar­rasta a Eu­ropa para uma si­tu­ação «in­sus­ten­tável e pe­ri­gosa». Em sua opi­nião, são muitas as re­a­li­dades que o de­mons­tram: do agra­va­mento das as­si­me­trias entre es­tados aos gra­vís­simos pro­blemas so­ciais, da re­gressão das con­di­ções de vida à cres­cente con­tes­tação po­pular à União Eu­ro­peia e aos seus ins­tru­mentos de do­mínio. Não há dis­cursos sobre «li­ber­dades», «de­mo­cracia» e «va­lores eu­ro­peus» ca­pazes de es­conder esta re­a­li­dade, ga­rante.

Assim, para o membro da Co­missão Po­lí­tica, a aná­lise para a dis­cussão em curso em torno do «fu­turo da Eu­ropa» deve partir desta aná­lise e não nos pres­su­postos apre­sen­tados pelas ins­ti­tui­ções da UE, apoi­ados em Por­tugal por PS, PSD e CDS. Aliás, acres­centou, os cinco ce­ná­rios cons­tantes no Livro Branco da Co­missão Eu­ro­peia têm pre­ci­sa­mente como ob­jec­tivo «salvar a UE como ins­tru­mento de do­mínio das trans­na­ci­o­nais e das grandes po­tên­cias, man­tendo in­to­cá­veis os seus pi­lares ne­o­li­beral, fe­de­ra­lista e mi­li­ta­rista e al­guns dos seus prin­ci­pais ins­tru­mentos» (ver caixa). Estes ce­ná­rios, acres­centou, con­vergem numa mesma linha de con­ti­nui­dade e apro­fun­da­mento da União Eu­ro­peia por via de «novos saltos de na­tu­reza fe­de­ra­lista».

Também na de­cla­ração de Roma não se põe em causa a es­sência das po­lí­ticas da UE nem a sua na­tu­reza, mas apenas e só se dis­cute o «ar­ranjo ins­ti­tu­ci­onal e de dis­tri­buição de poder que per­mita con­ti­nuar o rumo que con­duziu a Eu­ropa à ac­tual si­tu­ação», de­nun­ciou o di­ri­gente do PCP. Uma vez mais, con­cluiu Ângelo Alves, a UE tenta impor um «pen­sa­mento único na re­flexão sobre os ca­mi­nhos da Eu­ropa», re­cor­rendo à te­oria do «ini­migo ex­terno» para bran­quear as suas pró­prias res­pon­sa­bi­li­dades para, assim, levar mais longe a con­cen­tração de poder e para acen­tuar as suas ver­tentes «mi­li­ta­rista, se­cu­ri­tária e de afir­mação im­pe­ri­a­lista».

Rup­turas pro­gres­sistas

Na opi­nião do PCP, os povos da Eu­ropa não ne­ces­sitam de «mais do mesmo», por mais novos que se apre­sentem os ar­ranjos de poder ou as rou­pa­gens. A UE, na sua es­sência, não é re­for­mável, re­a­firmou Ângelo Alves, apon­tando a ur­gência de ques­ti­onar todo o pro­cesso de in­te­gração ca­pi­ta­lista e, de­sig­na­da­mente, os seus ins­tru­mentos cen­trais, como a União Eco­nó­mica e Mo­ne­tária, cuja «dis­so­lução or­ga­ni­zada» deve ser se­ri­a­mente dis­cu­tida, assim como o mer­cado único, com a sua «di­nâ­mica de di­ver­gência e as­si­me­tria».

A po­lí­tica comum de pescas e a po­lí­tica agrí­cola comum devem igual­mente ser postas em causa, assim como a po­lí­tica co­mer­cial, cada vez mais as­sente na li­be­ra­li­zação e na im­po­sição de tra­tados le­sivos de vá­rios sec­tores pro­du­tivos, de di­reitos e de so­be­rania. O PCP re­clama ainda a in­versão do rumo mi­li­ta­rista e in­ter­ven­ci­o­nista da UE que, apesar de con­tra­di­ções, «se con­firma como pilar eu­ropeu da NATO e em­purra os es­tados para ina­cei­tá­veis au­mentos das des­pesas mi­li­tares», e o aban­dono de uma po­lí­tica mi­gra­tória «de­su­mana» que ali­menta as agendas re­ac­ci­o­ná­rias e xe­nó­fobas.

Os co­mu­nistas en­tendem que neste mo­mento «es­pe­ci­al­mente de­li­cado» impõe-se avançar para «novas formas de co­o­pe­ração entre es­tados so­be­ranos e iguais em di­reitos», que ar­ti­culem «rup­turas de­mo­crá­ticas e pro­gres­sistas no plano na­ci­onal e in­ter­na­ci­onal».

Sub­missão não é ine­vi­tável

Ângelo Alves ter­minou a sua de­cla­ração in­sis­tindo na ideia de que a su­jeição às bru­tais im­po­si­ções da União Eco­nó­mica e Mo­ne­tária e da UE não é ine­vi­tável e que Por­tugal pode e deve li­bertar-se dos ins­tru­mentos e me­ca­nismos de «in­ge­rência, chan­tagem e ex­torsão». Para o di­ri­gente co­mu­nista, as de­cla­ra­ções do pre­si­dente do Eu­ro­grupo sobre os países do Sul da Eu­ropa, para lá do in­sulto da xe­no­fobia e ar­ro­gância que de­mons­tram, evi­den­ciam a «ide­o­logia que pre­side ao pro­cesso de im­po­sição, co­lo­ni­zação eco­nó­mica e con­cen­tração de poder em curso» na UE.

A so­lução para os pro­blemas na­ci­o­nais, e em geral para os dos povos da Eu­ropa, passa pre­ci­sa­mente pela «li­ber­tação dos ins­tru­mentos que cons­trangem o de­sen­vol­vi­mento dos es­tados, des­res­peitam a sua so­be­rania, his­tória e cul­tura e im­põem o ne­o­li­be­ra­lismo como dou­trina», in­siste o PCP, que de­fende a dis­so­lução da UEM e a re­cu­pe­ração pelos es­tados da so­be­rania mo­ne­tária e or­ça­mental, ade­quando as po­lí­ticas eco­nó­micas às ne­ces­si­dades es­pe­cí­ficas de cada povo e Es­tado e ao re­la­ci­o­na­mento eco­nó­mico e co­mer­cial mu­tu­a­mente van­ta­joso.

A re­ne­go­ci­ação da dí­vida, a adopção de po­lí­ticas de es­tí­mulo à pro­dução, a re­cu­pe­ração do con­trolo pú­blico da banca e dos sec­tores es­tra­té­gicos da eco­nomia e a pros­se­cução de po­lí­ticas ex­ternas con­formes ao in­te­resse de cada povo são ou­tros vec­tores cen­trais de­fen­didos pelos co­mu­nistas. Ma­ni­fes­tando a sua pro­funda con­fi­ança na luta dos tra­ba­lha­dores e dos povos, o di­ri­gente do PCP in­sistiu na pos­si­bi­li­dade de ca­mi­nhos al­ter­na­tivos e re­a­firmou a ideia de que «nin­guém pode negar o di­reito so­be­rano de Por­tugal de de­cidir sobre o seu de­sen­vol­vi­mento e afir­mação en­quanto nação in­de­pen­dente».
 

UE en­saia fuga em frente

O Livro Branco da Co­missão Eu­ro­peia e a De­cla­ração de Roma não só não dão res­posta aos pro­blemas dos tra­ba­lha­dores e dos povos da Eu­ropa como, pelo con­trário, os ins­tru­men­ta­lizam par en­saiar novas «fugas em frente de na­tu­reza ne­o­li­beral, fe­de­ra­lista e mi­li­ta­rista», de­nun­ciou Ângelo Alves na con­fe­rência de im­prensa da pas­sada quinta-feira, 23. Para lá da fra­se­o­logia, o que se aponta é o au­mento dos gastos mi­li­tares e da in­dús­tria ar­ma­men­tista, o pros­se­gui­mento da «Eu­ropa For­ta­leza», o apro­fun­da­mento do mer­cado comum e da União Eco­nó­mica e Mo­ne­tária e o avanço na con­cen­tração ca­pi­ta­lista em áreas como o am­bi­ente e a energia.

Re­jei­tando a ideia de que o fu­turo da Eu­ropa tem apenas um ca­minho, o Par­tido re­a­firma que «mais União Eu­ro­peia não sig­ni­fica mais Eu­ropa», antes pelo con­trário. Da mesma forma, os co­mu­nistas con­si­deram falsa a tese de que os in­te­resses na­ci­o­nais se de­fendem no quadro do re­forço da UE, visto que a UE e o euro «sig­ni­fi­caram e sig­ni­ficam bru­tais cons­tran­gi­mentos contra os in­te­resses na­ci­o­nais».

 



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